amigo visita
...Quem?
Aqui?
Não, acho que o senhor se enganou de endereço. Este número não existe.
Derrubaram uma casa logo ali adiante, foi para colocar o alicerce daquele viaduto. Mas faz anos, eu era menina.
Pra onde ele foi? Acho que voltou pro Nordeste. Ou ganhou na Mega-Sena ou foi preso.
Sei lá, tem diferença?
Não tenho endereço não. Agora, o senhor me dá licença que tô ocupada."
Fecha a porta. Lá em cima do viaduto passa sirene.
O homem coça a cabeça. Lê o endereço. Confirma os números. Olha pra lá, olha pra cá... e nada parece com as lembranças que tinha do lugar. O viaduto sustentado por alicerces delgados como girafas. Onde antes havia árvores estão postes de iluminação. Uma quadra de casas geminadas deu origem a uma fábrica abandonada. Os jardins viraram recantos de entulhos e cacos de azulejo. O campo de bater bola agora virou catedral dos crentes. Ele sabe que são lembranças reais e não de um sonho: o que diferencia uma da outra é uma certeza fina, tênue, resistente como uma teia de aranha. E é só por conta desta certeza que ele caminha até o alicerce do viaduto. Uma parede milagrosamente limpa de grafiteiros e pichadores. Até agora.
Escreve sua mensagem ao amigo. É breve. Descreve como está a vida, como andam os filhos, os dias tediosos do trampo, o último filme a que assistiu. Pensou em deixar email, número de celular. Mas não sabe se haveria conversa para tanto. Depois vai embora sabendo que logo o temporal de verão vai apagar o giz.
Brontops
26/09/2010
21/09/2010
(apanharam-nos no ninho, quando nossos olhos sequer tinham se aberto. Colocaram-nos em gaiolas, e disseram: "agora esse é o céu". E foram dormir, achando que tinham nos calado. Mas a manhã veio e o cantar despertou dentro de nossos pequenos peitos amarelos. Eles não queriam acreditar naquilo. Cortaram nossas asas. Com toda a crueldade possível, cortaram nossas asas. E foram dormir, achando que tinham nos calado. Mas a manhã veio e o cantar despertou dentro de nossos pequenos peitos amarelos. Agora sim, tínhamos comprado briga com eles. Arrancaram nossas penas, furaram nossos olhos, nos deixaram sem água e comida. Foram dormir. A manhã veio e o cantar despertou dentro de nossos pequenos peitos amarelos. Eles nos mataram e jogaram nossos corpos em meio aos ratos. Foram dormir, achando que tinham nos calado. Mas a manhã veio e o cantar despertou, agora de dentro de um céu vermelho vivo, em brasa.
Murilo Hildebrand de Abreu
Murilo Hildebrand de Abreu
17/09/2010
sobras
narro a sobra
que esqueceste - propositalmente -
de teu corpo
sobre mim
um gato,
uma fuligem
sinais de adeus
Mariana Campos
http://buhobranca.blogspot.com/
narro a sobra
que esqueceste - propositalmente -
de teu corpo
sobre mim
um gato,
uma fuligem
sinais de adeus
Mariana Campos
http://buhobranca.blogspot.com/
06/09/2010
05/09/2010
18/07/2010
descartáveis
consumimos
plásticos
sobras
plásticas
feições
impermeáveis
montes
caixas
latas
garrafas
embalagens
recicláveis
em aterros
clandestinos
da Maré
desterros
favelas
incontáveis
restos
catadores
rostos
tesouros
humanos
estimáveis
bens
materiais
valores
patrimônios
imateriais
inestimáveis
perdas
desperdícios
de energia
geradores
indivíduos
apreciáveis
gastos
racionais
encefálica
massa
de resíduos
sólidos
indispensáveis
leitos
lençóis
freáticos
controle
freios
imprescindíveis
desejáveis
feitos
com efeito
sobre efeitos
implacáveis
sustentáveis
ações
reparações
reparos
ações
tentáveis
(Marcio Nicolau)
www.espacointertextual. blogspot.com
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tentáveis
(Marcio Nicolau)
www.espacointertextual.
05/07/2010
02/07/2010
23 de novembro de 1979*
Trabalhar em barco foi uma das piores coisas que já fiz. Todo dia era aquela solidão esticada. De noite, diante do mar, não havia nada além da escuridão.
Pouco se conversa nesses momentos. A audição deve ser o principal sentido, pois o invisível prega peças e o mar braveia a qualquer hora.
Quantas madrugadas de mar revolto. Afoito. Passei a odiar meu antigo companheiro. Justo ele, que sempre foi meu confidente, minha memória e meu pensamento. Embarcado, era meu inimigo.
Não havia mulheres e músicas compactuando cigarros e beijos. Não havia trapiche. Havia apenas outros inseguros homens à espera do porto: nossa mais ansiosa promessa. Em terra firme teríamos o amor rápido e a pesagem do camarão.
*Trecho de Retratos da Garoupa de Fernanda Grigolin, livro ainda inédito
Trabalhar em barco foi uma das piores coisas que já fiz. Todo dia era aquela solidão esticada. De noite, diante do mar, não havia nada além da escuridão.
Pouco se conversa nesses momentos. A audição deve ser o principal sentido, pois o invisível prega peças e o mar braveia a qualquer hora.
Quantas madrugadas de mar revolto. Afoito. Passei a odiar meu antigo companheiro. Justo ele, que sempre foi meu confidente, minha memória e meu pensamento. Embarcado, era meu inimigo.
Não havia mulheres e músicas compactuando cigarros e beijos. Não havia trapiche. Havia apenas outros inseguros homens à espera do porto: nossa mais ansiosa promessa. Em terra firme teríamos o amor rápido e a pesagem do camarão.
*Trecho de Retratos da Garoupa de Fernanda Grigolin, livro ainda inédito
01/07/2010
wolak
olha o mar.
e chora.
do outro lado estão todos mortos.
restaram estas mulheres: ela e suas sementes.
e uma dor sutil do lado esquerdo.
que nunca mais passou.
veronika paulics
http://www.andoape.blogspot. com
olha o mar.
e chora.
do outro lado estão todos mortos.
restaram estas mulheres: ela e suas sementes.
e uma dor sutil do lado esquerdo.
que nunca mais passou.
veronika paulics
http://www.andoape.blogspot.
01/05/2010
29/04/2010
22/04/2010
* * * * *
A luz do dia do meio dia rebenta pelas frestas e portas, insinua-se por buracos no forro, esmaecida pelas cores frias dos vitrais. Dissemina-se pela porta da entrada. Por pouco, a igreja não está vazia. Sentados em bancos, ajoelhados. Parados diante dos altares, benzendo-se na pia batismal. Pombos sobre um parapeito. Abismo. Silêncio. Ecos. Arquitetura para reflexão e induzir os fiéis a olhar para o alto. Buzinas. O piso com um bordado de linhas retas entrecruzadas. Cristina entra, fecha as pernas dos óculos escuros. Faz o sinal para o Cristo adiante no altar. Senta-se em uma das últimas fileiras. Cabeça baixa. Mais adiante, uma senhora com terço. Os dedos correm as contas. Cristina abre a bolsa, passa um lenço sobre o suor da testa. Verifica o celular. Sem mensagens. Muda para o modo vibrador. Alguém tosse. Ecos. Um ônibus freia, um urro animalesco no asfalto. Mas todos continuam em suas preces silenciosas. As paredes isolam como uma gruta. As imagens dos Santos: faces tranquilas, olhares tristes, lábios cerrados, rostos raros hoje em dia. As mãos dedilham o ar, acariciam o vazio. Cristina não reza, continua olhando o próprio colo, ou a senhora, ou o teto. Disfarça o celular na mão. Um folheto dobrado em muitas vezes fora abandonado sobre o banco a seguir. Ela estica o braço para pegá-lo. Reaberto, o folheto lembra um mapa, cheio de vincos. Cristina lê a Segunda Leitura e o Evangelho. Parábolas. O Bom Samaritano. Músicas. Creio em Deus Pai, todo poderoso. Confere o horário. Sirenes. Uma moto passa a toda velocidade. Cristina conta as estrelas que atravessam o forro do teto. Verifica o celular. Sem mensagens. Outra tosse. Quase distraidamente, percebe um homem em um terno fino sentado do lado oposto do mesmo banco; permanece de óculos escuros, apesar de estar no interior da igreja. Contendo o medo, ela guarda o celular na bolsa, faz o sinal da cruz e se levanta. Procura manter a calma. Mas há outros dois homens engravatados na porta de saída. Eles estão em pé, fingem orar. Cristina ruma em direção ao altar. Surge um quarto homem detrás de uma das colunas. Passos mais rápidos às suas costas. Faz um desvio final e entra na cabine do confessionário. Sozinha, atrás da cortina de tecido espesso. No escuro. Cristina retira da bolsa a vinte e dois. Fica a espera. (...)1. Há um aviso com os dias e os horários nos quais o padre estará disponível para prestar o sacramento. Os homens sabem que neste horário o padre almoça. Talvez esteja comendo um coroinha. Um deles faz um sinal para que os demais cerquem o confessionário. Os três se aproximam. Chamam-na pelo nome, sussuram, não querem chamar a atenção. Dona Cristina, por favor, sai daí. O Doutor mandou a gente não machucar a senhora. No interior da bolsa, uma luz se acende. Chega uma mensagem, mas de outra pessoa. Está em caixa alta e ela não terá oportunidade de ler: FOGE. ELE DESCOBRIU. MA. Sem resposta, um deles abre o confessionário. Ouve-se um tiro. Não atinge ninguém. Os demais frequentadores da Igreja pressentem circunstâncias incomuns. Alguém corre. Pombos voam. Apesar da ordem do Doutor, o sangue ferve e eles entram à força. Cristina recebe alguns socos, a arma cai pesadamente. Bolsa aberta no chão. Celular corre que nem barata e desaparece em alguma fresta. Os homens carregam-na para fora. Um deles esconde a arma em um lenço. Aquela senhora que rezava pergunta o que aconteceu. O líder responde, pressão baixa, muito calor, ela desmaiou. Ela acompanha os quatro carregando-na em direção à luz da rua. Ela faz o sinal da cruz e pensa Graças a Deus estes anjos estavam aqui para socorrê-la. O sangue pinga do nariz de Cristina formando estrelas gordas sobre as linhas retas no piso.
(1) (Criar neste espaço best-seller de 300 páginas contando a história de Cristina o qual o deixará rico e insuportável, requisitos imprescindíveis para sentido)
Brontops
A luz do dia do meio dia rebenta pelas frestas e portas, insinua-se por buracos no forro, esmaecida pelas cores frias dos vitrais. Dissemina-se pela porta da entrada. Por pouco, a igreja não está vazia. Sentados em bancos, ajoelhados. Parados diante dos altares, benzendo-se na pia batismal. Pombos sobre um parapeito. Abismo. Silêncio. Ecos. Arquitetura para reflexão e induzir os fiéis a olhar para o alto. Buzinas. O piso com um bordado de linhas retas entrecruzadas. Cristina entra, fecha as pernas dos óculos escuros. Faz o sinal para o Cristo adiante no altar. Senta-se em uma das últimas fileiras. Cabeça baixa. Mais adiante, uma senhora com terço. Os dedos correm as contas. Cristina abre a bolsa, passa um lenço sobre o suor da testa. Verifica o celular. Sem mensagens. Muda para o modo vibrador. Alguém tosse. Ecos. Um ônibus freia, um urro animalesco no asfalto. Mas todos continuam em suas preces silenciosas. As paredes isolam como uma gruta. As imagens dos Santos: faces tranquilas, olhares tristes, lábios cerrados, rostos raros hoje em dia. As mãos dedilham o ar, acariciam o vazio. Cristina não reza, continua olhando o próprio colo, ou a senhora, ou o teto. Disfarça o celular na mão. Um folheto dobrado em muitas vezes fora abandonado sobre o banco a seguir. Ela estica o braço para pegá-lo. Reaberto, o folheto lembra um mapa, cheio de vincos. Cristina lê a Segunda Leitura e o Evangelho. Parábolas. O Bom Samaritano. Músicas. Creio em Deus Pai, todo poderoso. Confere o horário. Sirenes. Uma moto passa a toda velocidade. Cristina conta as estrelas que atravessam o forro do teto. Verifica o celular. Sem mensagens. Outra tosse. Quase distraidamente, percebe um homem em um terno fino sentado do lado oposto do mesmo banco; permanece de óculos escuros, apesar de estar no interior da igreja. Contendo o medo, ela guarda o celular na bolsa, faz o sinal da cruz e se levanta. Procura manter a calma. Mas há outros dois homens engravatados na porta de saída. Eles estão em pé, fingem orar. Cristina ruma em direção ao altar. Surge um quarto homem detrás de uma das colunas. Passos mais rápidos às suas costas. Faz um desvio final e entra na cabine do confessionário. Sozinha, atrás da cortina de tecido espesso. No escuro. Cristina retira da bolsa a vinte e dois. Fica a espera. (...)1. Há um aviso com os dias e os horários nos quais o padre estará disponível para prestar o sacramento. Os homens sabem que neste horário o padre almoça. Talvez esteja comendo um coroinha. Um deles faz um sinal para que os demais cerquem o confessionário. Os três se aproximam. Chamam-na pelo nome, sussuram, não querem chamar a atenção. Dona Cristina, por favor, sai daí. O Doutor mandou a gente não machucar a senhora. No interior da bolsa, uma luz se acende. Chega uma mensagem, mas de outra pessoa. Está em caixa alta e ela não terá oportunidade de ler: FOGE. ELE DESCOBRIU. MA. Sem resposta, um deles abre o confessionário. Ouve-se um tiro. Não atinge ninguém. Os demais frequentadores da Igreja pressentem circunstâncias incomuns. Alguém corre. Pombos voam. Apesar da ordem do Doutor, o sangue ferve e eles entram à força. Cristina recebe alguns socos, a arma cai pesadamente. Bolsa aberta no chão. Celular corre que nem barata e desaparece em alguma fresta. Os homens carregam-na para fora. Um deles esconde a arma em um lenço. Aquela senhora que rezava pergunta o que aconteceu. O líder responde, pressão baixa, muito calor, ela desmaiou. Ela acompanha os quatro carregando-na em direção à luz da rua. Ela faz o sinal da cruz e pensa Graças a Deus estes anjos estavam aqui para socorrê-la. O sangue pinga do nariz de Cristina formando estrelas gordas sobre as linhas retas no piso.
(1) (Criar neste espaço best-seller de 300 páginas contando a história de Cristina o qual o deixará rico e insuportável, requisitos imprescindíveis para sentido)
Brontops
19/04/2010
15/04/2010
acredite, assim, redondo
o oco no adentro da casca:
casa por dentro do ovo
veronika paulics
http://www.andoape.blogspot. com
o oco no adentro da casca:
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veronika paulics
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